Novo tratamento para queimados no SUS começa em setembro 

Bancos de tecidos serão autorizados para captar, processar e distribuir a membrana amniótica para curativos após portaria e regulamento técnico
Por Stela Pastore / Publicado em 22 de maio de 2025

Após quase quatro anos da aprovação pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) recomendou, no dia 9 de maio, o uso da membrana amniótica no tratamento de queimados no Brasil. A Coordenadora-geral do Sistema Nacional de Transplantes (SNT), Patrícia Freire, comemorou a recomendação da Conitec. Segundo ela, a expectativa é de que, com a publicação da portaria e o novo regulamento técnico previsto para setembro, os bancos de tecidos autorizados já comecem a captar, processar e distribuir o material. Com larga experiência em saúde pública, com foco em transplantes e logística de transporte de órgãos e tecidos, Patrícia Freire falou ao jornal Extra Classe sobre a importância deste material biológico para o tratamento dos pacientes e para a saúde do país.

Extra Classe – Qual sua avaliação sobre esta nova alternativa de tratamento?
Patrícia Freire – A incorporação do uso da membrana amniótica no SUS representa um superavanço. A tecnologia só é incorporada ao SUS pela Conitec quando há evidências comprovadas de benefícios e segurança para os pacientes. O benefício do uso da membrana amniótica como curativo em queimados tem comprovação científica e há vasta literatura a respeito, com efeitos na redução da dor, rápida cicatrização, barreira protetora contra infecções, e permite movimentação ativa para os pacientes, prevenindo sequelas por retração cicatricial.

EC – Quando os pacientes queimados no Brasil poderão contar com a membrana amniótica para tratamento no SUS?
Patrícia – O regulamento técnico do Sistema Nacional de Transplantes sairá em setembro. O que saiu até agora foi o registro de deliberação da plenária da Conitec, dando parecer favorável à incorporação. O prazo começa a contar a partir da publicação da Portaria pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Sectis/MS), o que ainda não ocorreu, visto que a reunião que recomendou o uso foi recente, no dia 9 de maio. Só após a portaria é que o procedimento estará formalmente incorporado ao SUS.

EC – O que a Coordenação-geral do Sistema Nacional de Transplantes está agilizando enquanto a portaria não é publicada?
Patrícia – O novo regulamento técnico do SNT será lançado em setembro desse ano e trará todos os detalhes da formação dos profissionais e da qualificação necessária para trabalhar com esse tipo específico de tecido humano; assim como as normas para captação das membranas, seleção das pacientes doadoras e normas gerais para processamento, armazenamento e disponibilização pelos bancos de tecidos.

EC – Há possibilidade de usar material antes de setembro?
Patrícia – Alguns bancos de tecidos já captam membranas sob projetos de pesquisa e, em casos excepcionais, devidamente justificados pela gravidade. A coordenação geral do SNT pode liberar a dispensação desse tecido pelos bancos. Mas somente em casos extremamente excepcionais. Após a portaria de incorporação e publicação do regulamento técnico, o banco de tecidos que pedir autorização e for autorizado poderá iniciar os procedimentos de coleta, processamento e disponibilização.

EC – Há material suficiente nas maternidades? Como será o processo de captação da membrana e sua distribuição aos pacientes?
Patrícia – A oferta é mais que suficiente pra atender a toda a demanda do SUS. Basta olhar o número de nascidos vivos por ano. Os profissionais dos bancos de tecidos é que farão a captação, em maternidades previamente referenciadas pelos bancos. Não há necessidade que seja em todas as maternidades, nem em todas as regiões.

EC – Os quatro bancos de pele do país (RS, PR, SP e RJ) são suficientes para atender à nova demanda?
Patrícia – Um banco por região geográfica (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-oeste) seria suficiente pra cobrir a demanda, porém, os estados ficarão livres para avaliar suas demandas, a organização de suas redes de atenção à saúde e, caso julguem necessário, poderão solicitar a autorização de mais bancos de tecidos que trabalhem com a membrana amniótica.

EC – Além de tratamento humanizado e ganhos de qualidade para o paciente, a medida também tem vantagens econômicas?
Patrícia – Sim, representa diminuição de custos, pois a membrana, como tecido humano, não é objeto de comercialização. Assim, todo paciente que precisar, basta que a equipe médica solicite ao banco de tecido, que a membrana será disponibilizada, sem custo algum para os doentes. Há outros tipos de curativos sintéticos caríssimos que não estão disponíveis para a população.

EC – Qual a avaliação dos benefícios desse material no SUS?
Patrícia – A expectativa do Ministério da Saúde é muito positiva e abrange diversos aspectos. Ampliação do acesso ao tratamento alternativo, visto a ocorrência anual de mais de 1 milhão de queimados no país (sendo 95% atendidos pelo SUS). Melhora a recuperação e qualidade de vida dos pacientes, com a aceleração da cicatrização, a redução da dor e a diminuição das sequelas, resultam em uma recuperação mais rápida e com melhor qualidade de vida para os pacientes, diminuindo o tempo de internação hospitalar. Outras vantagens são a redução significativa de gastos públicos por ser um material de baixo custo, especialmente quando comparado aos curativos sintéticos e aos enxertos de pele, que podem ter um custo elevadíssimo por paciente. A nova tecnologia pode liberar leitos em unidades de queimados, já que o tempo de internação tende a ser menor. Isso pode, inclusive, viabilizar a reabertura de leitos que estavam desativados por falta de recursos. Com isso, o Brasil se alinha a outros países que já utilizam amplamente a membrana amniótica em seus sistemas de saúde, como alternativa na melhora da dor e na promoção da cicatrização em vítimas de queimadura.

Material publicado no jornal Extra-Classe

https://www.extraclasse.org.br/saude/2025/05/novo-tratamento-para-queimados-no-sus-comeca-em-setembro/